“Saulo, respirando ainda ameaças e morte contra os discípulos do Senhor,
dirigiu-se ao sumo sacerdote e lhe pediu cartas para sinagogas de Damasco,
a fim de que, caso achasse alguns que eram do Caminho, assim homens como mulheres,
os levasse presos para Jerusalém”
(Atos 9.1, 2).
Da tribo de Benjamim, Saulo de Tarso era um judeu muito culto e um fariseu zeloso da Lei Divina, que seguia seriamente a mais perfeita tradição judaica e, muito provavelmente, crescera orando muito. Mas, por considerar o cristianismo um movimento herético, tornou-se um implacável e cruel perseguidor dos cristãos (Filipenses 3.4-7). De forma dramática, no entanto, Deus invadiu a vida desse homem para trazê-lo, decisivamente, à fé cristã. Atos 9.3-5 relata esse emocionante encontro: “Seguindo ele estrada fora, ao aproximar-se de Damasco, subitamente uma luz do céu brilhou ao seu redor, e caindo por terra, ouviu uma voz que lhe dizia: Saulo, Saulo, por que me persegues? Ele perguntou: Quem és tu, Senhor? E a resposta foi: Eu sou Jesus, a quem tu persegues.”
Ao se levantar do chão, Saulo abriu os olhos, porém nada conseguia enxergar. Imagino que deve ter sido um momento assustador e de grande conflito interno para aquele jovem e exemplar fariseu. Por que Deus o havia cegado? E como poderia um irrepreensível defensor da Lei Divina, que acreditava agir corretamente quando atacava e prendia os cristãos, ser acusado pelo próprio Deus de persegui-lO?
Saulo foi, então, levado até Damasco por alguns homens que viajavam com ele e lá permaneceu cego por três dias.
Na Sua infinita bondade, graça e misericórdia, o Senhor tirou a visão daquele homem para que os olhos do seu coração fossem, definitivamente, abertos e ele pudesse enxergar a pessoa, a majestade e a santidade de Jesus.
Por todo tempo que esteve cego, Saulo não comeu e também nada bebeu, apenas permaneceu orando e foi somente naquela escuridão que ele conseguiu enxergar a mais surpreendente e reveladora razão da sua própria existência. E quando Ananias, homem enviado por Deus para lhe restaurar a visão, impôs-lhe as mãos, o maior dos pecadores se transformara no principal dos missionários.
Paulo, naquele mesmo instante, recuperou a visão e, olhando para Ananias, recebeu dele os desígnios do próprio Deus para sua vida: “O Deus de nossos pais, de antemão, te escolheu para conheceres a sua vontade, veres o Justo e ouvires uma voz da sua própria boca, porque terás de ser sua testemunha diante de todos os homens, das coisas que tens visto e ouvido” (Atos 22.14, 15).
Deus, muitas vezes, permite que cheguemos também a lugares muito escuros na nossa existência. Pode ser nas densas sombras das provações, ou no intenso breu causado pela nossa própria desobediência, ou, até mesmo, pelo simples fato de vivermos num mundo caído e escuro, cheio de dor e arruinado pelo pecado. Lugares que nos deixam completamente cegos, onde jamais conseguiríamos enxergar sem a Sua ajuda.
O mais emocionante e surpreendente, no entanto, é que Deus usa esses momentos de trevas para nos revelar e ensinar lições preciosas que, provavelmente, não as compreenderíamos na luz. O problema é que, muitas vezes, apavorados com a escuridão e sem saber o que fazer, ignoramos o poder da oração. E ao invés de buscarmos a inesgotável fonte de luz que resplandecia na fidelidade de Daniel (Daniel 6.4), vacilamos ao permitir que a sombra da dúvida que envolveu o coração de Tomé (João 20.24-27) escureça também nossa fé e esperança, ante a incerteza das circunstâncias das quais nos tornamos reféns.
Mas, quando percebemos que o Deus soberano está, continuamente, trabalhando em nós e fazendo algo com a nossa angústia para realizar seus propósitos, uma luz se acende em nossa consciência e ilumina tesouros escondidos que jamais imaginaríamos descobrir naquelas circunstâncias.
Em meio ao sofrimento encontramos, então, a riqueza de desfrutar da paz e do descanso no amor e no cuidado de Deus e é isso que nos move a confiar sem entender, a suportar sem reclamar, a padecer sem sofrer, a nos entristecer com alegria e a, constantemente, agradecer pela maravilhosa graça que recebemos, sem jamais merecer.
Quando compreendemos que a intensa luz que cegou Saulo, foi a mesma que lhe restaurou a visão, conseguimos enxergar também que a graça que nos ordena dor e sofrimento por causa do Evangelho, será sempre a mesma que irá nos sustentar e fazer de nós um instrumento útil nas mãos do Senhor. Por mais densa que sejam, então, as trevas, elas não prevalecerão em nosso caminho, porque a Luz de Cristo estará sempre brilhando em nós (João 8.12) e o inimigo saberá, a partir daí, que já não temos mais medo do escuro.
Editorial de Walter Feliciano
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